terça-feira, 23 de agosto de 2011

Terceira Conferência Municipal de Saúde


No dia 13 de julho de 2011, ocorreu a 3a Conferência Municipal de Saúde de Serrinha, Bahia. O evento foi realizado na AABB e reuniu centenas de participantes entre usuários, profissionais de saúde e gestores, além de representantes de entidades como defensoria pública, câmara de vereadores, imprensa, etc. Com inicio às 08:00h, através da inscrição dos participantes e entrega do material de apoio.



Na abertura do evento, foram feitos vários pronunciamentos, os quais ressaltaram a importância da saúde na vida das pessoas, as potencialidade e dificuldades do Sistema Único de Saúde – SUS e a relevância de realizar uma conferência municipal de saúde como um dos meios de promover a participação popular e controle social. Outros assuntos tratados nestes pronunciamentos foram a necessidade de mais recursos para o SUS, a regulamentação da Emenda 29 e o problema da falta de médicos. Foram citados alguns problemas de saúde do município de Serrinha, como a baixa resolutividade dos hospitais de urgência e emergência, a cobrança de consultas e procedimentos em hospitais conveniados ao SUS, a extrema demora e dificuldade em marcar exames, a falta de critérios para alta hospitalar, as más condições em que são transferidos os pacientes para outros municípios, etc.

Em seguida, foi feita a leitura do regimento interno da 3a Conferência Municipal de Saúde, onde estavam incluídos os objetivos, tema e eixo da atividade.

Objetivos:

I. Impulsionar, reafirmar e buscar a efetividade dos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde – SUS, garantidos na Constituição Federal e na Lei Orgânica da Saúde, na perspectiva de fortalecimento da Reforma Sanitária;

II. Avaliar o SUS e propor condições de acesso à saúde, ao acolhimento e à qualidade da atenção integral;

III. Definir diretrizes e prioridades para as políticas de saúde, com base nas garantias constitucionais da Seguridade Social, no marco do conceito ampliado e associado aos Direitos Humanos;

IV. Fortalecer o Controle Social no SUS e garantir formas de participação dos diversos setores da sociedade na 3a Conferência Municipal de Saúde.

Tema: “TODOS USAM O SUS! NA SEGURIDADE SOCIAL, POLÍTICA PÚBLICA E PATRIMÔNIO DO POVO BRASILEIRO”.

Eixo: ACESSO E ACOLHIMENTO NO SUS – DESAFIOS NA CONSTRUÇÃO DE UMA POLÍTICA SAUDÁVEL E SUSTENTÁVEL.


Após a leitura do regimento interno, assistimos as apresentações de três palestrantes:

Políticas Públicas, Política de Saúde na Seguridade Social: os desafios da implantação dos princípios da integralidade, universalidade e equidade. Palestrante: Daniela Neves, auditora em saúde pública;

Participação, Controle Social e Incremento à Ação Comunitária. Palestrante: Grace Yara, representante da CUT;

Os Desafios da Gestão do SUS para Reorientação de Saúde: Intersetorialidade, Financiamento, Pacto pela Saúde, Relação Público x Privado, Gestão do Sistema, do Trabalho e da Educação em Saúde. Palestrante: Humberto Torreão, médico sanitarista e emergencista.

A Equipe de Saúde da Família de Bela Vista participou ativamente da 3a Conferência Municipal de Saúde, com três delegados: a ACS Nilza, a dentista Alane e o médico Bruno. A ACS Ana também esteve presente.



O médico da equipe, Dr. Bruno Matos Corrêa, exerceu o direito de voz que tinha como delegado e fez um pronunciamento no final da manhã. Apresentou sua opinião, como representante dos trabalhadores da saúde, a respeito de questões como escassez de médicos, precarização das relações de trabalho, PCCS (plano de cargos, carreira e salário), serviço civil obrigatório, carreira de estado para médicos do SUS, flexibilização da carga horária dos profissionais da Estratégia de Saúde da Família, etc. Seguem abaixo alguns trechos do pronunciamento:


“Não considero que há deficiência de produção de profissionais de saúde no país. Há sim, uma má distribuição destes profissionais. No caso de médicos, há regiões do país com grande concentração, como Sudeste, aonde em certas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo se chega a uma proporção de 1 médico para cada 250 habitantes. Enquanto em outras regiões, como o Norte e Nordeste, há cidades do Maranhão e Rondônia, por exemplo, onde esta proporção chega a 1 médico para cada 1800 habitantes.”

“Entretanto, não considero que esta desigualdade na distribuição de médicos nas diferentes regiões do Brasil justifique a abertura de novas faculdades de medicina. Nem considero que justifique a validação imediata dos diplomas de médicos formados em Cuba ou outros países, sem passar por uma avaliação que comprove a sua capacidade.”

“O Brasil é recordista mundial em número absoluto de faculdades de medicina. Portanto, ao contrário do que muitos pensam, não acredito que o problema da falta de médicos em algumas áreas do país se resolva com a abertura de novas faculdades de medicina.”

“Abrir mais faculdades de medicina não só vai falhar em acabar com a escassez de médicos, porque a grande maioria dos médicos formados continuará a se concentrar nas grandes cidade e capitais, como vai diminuir a qualidade da formação destes e prejudicar a população que futuramente vai ser atendida por estes profissionais.”



Realmente, no Brasil a concentração de médicos cresce exponencialmente, em níveis jamais vistos. Recente levantamento do Conselho Federal de Medicina (CFM) aponta que, entre 2000 e 2009, a quantidade de médicos aumentou 27% - de 260.216 para 330.825. No mesmo intervalo de tempo, a população brasileira cresceu aproximadamente 12%, segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 2000, havia no país um médico para cada grupo de 658 habitantes; em 2009, a situação passou a ser de um médico para 578 habitantes. A quantidade de faculdades de Medicina no Brasil só era menor do que na Índia até 2002, elas eram 115. Segundo dados de levantamento apresentado pela Associação Médica Brasileira (AMB), durante o 11º Encontro Nacional das Entidades Médicas (Enem), em 2007 elas chegaram a 167. Segundo Adib Jatene, em 2010 saltou para 181 e hoje o Brasil já é o país com mais faculdades de medicina no mundo. Segundo Antonio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica, o sistema educacional no Brasil fez opção pela quantidade, deixando em último plano a excelência na qualificação. Formamos muito, mas formamos mal. Resultado: vários dos profissionais postos no mercado representam perigo à saúde e a vida dos cidadãos.


“Devemos buscar estratégias que levem a uma melhor distribuição destes profissionais, que já são em número suficiente para atender às demandas de saúde do país, desde que melhor distribuídos. Cito algumas destas estratégias: 1. Criação de cotas, nas faculdades existentes, para indivíduos provenientes de áreas remotas ou desassistidas, estabelecendo-se a condição de atuarem nos municípios dos quais vieram por um determinado período de tempo. 2. Criação de uma carreira de estado para os profissionais de saúde do SUS, com entrada por concurso e a nível nacional. Como acontece com promotores e juízes, os profissionais iniciariam a carreira em locais mais distantes e desassistidos e, de acordo com a progressão da carreira, poderiam solicitar transferência para cidades maiores e mais desenvolvidas. 3. A implantação do PCCS (Plano de Cargos Carreira e Salários) para os profissionais de saúde do SUS também é uma excelente medida para atrair profissionais de saúde para regiões desassistidas.”


“Outra estratégia é a criação do Serviço Civil Obrigatório. A qual foi a mais citada e defendida nesta conferência. Não sou contra o Serviço Civil Obrigatório, entretanto acho que vale a pena levantar algumas questões e ressalvas a seu respeito. Em primeiro lugar, ao contrário do que ficou parecendo pelo que foi dito aqui anteriormente, o Serviço Civil Obrigatório não vai resolver sozinho o problema da falta de médicos. Não podemos acreditar nesta falácia. O problema da escassez destes profissionais é multifatorial e, como tal, para que seja resolvido ou atenuado, necessita de intervenções e estratégias que atuem nos seus vários fatores determinantes. Não existe, nem existirá, uma solução mágica, com efeitos imediatos. Os resultados, se aplicadas as intervenções adequadas, serão observados apenas a médio e longo prazo. Assim como não há receita de bolo, com estratégias padrões para todos os lugares. As intervenções deverão levar em conta as realidades locais onde serão aplicadas, as quais variam amplamente ao redor do país. Especificamente em relação ao Serviço Civil Obrigatório, preocupa-me muito a qualidade do atendimento que será prestado por estes profissionais, que não estarão trabalhando no que gostam nem por vontade própria, mas porque serão obrigados. Assim como me preocupa a falta de consideração a um dos mais propalados princípios da Atenção Primária em Saúde: a longitudinalidade.”


“A longitudinalidade está, inclusive, descrito na portaria 648 do Ministério da Saúde, como um dos fundamentos da Atenção Primária: III - desenvolver relações de vínculo e responsabilização entre as equipes e a população adscrita garantindo a continuidade das ações de saúde e a longitudinalidade.”


"Mas como cumprir este princípio com uma estratégia que, além de obrigatória, tem duração limitada de apenas dois anos. Após cumprir este período de serviço obrigatório, é factível esperar que o profissional de saúde permaneça atendendo àquela comunidade? O mais provável é que, já que está ali por obrigação, abandone o serviço assim que puder, interrompendo a continuidade do cuidado.”



“Mais uma estratégia, citada nesta conferência, que considero válida é a redução da carga horária de trabalho dos profissionais da Estratégia de Saúde da Família. Com a disponibilização de empregos com 20 ou 30 horas semanais, como acontece para médicos do trabalho.”


“Temos que encontrar meios para valorizar os profissionais de saúde do SUS. É absurda a atual precariedade das relações de trabalho destes profissionais. A maioria é contratada, diga-se de passagem, por contratos nulos, e por este motivo não tem respeitado nenhum direito trabalhista. Não há segurança no emprego - podem ser demitidos a qualquer momento, sem justa causa ou aviso prévio. Os salários, que deveriam ser pagos até o quinto dia útil do mês seguinte, sofrem atrasos constantes. Não há direito a férias, décimo terceiro salário e FGTS.”


“Não há plano de cargo, carreira e salários. Ou seja, não há perspectiva de crescimento profissional, reconhecimento, promoção e melhor remuneração futura. Independente do tempo de experiência profissional, da qualificação, número de cursos e especializações realizados, daqui a 10 ou 20 anos estaremos na mesma posição que estamos hoje, inclusive com mesmos salários que profissionais recém-formados.”


“Trabalhamos em condições precárias, com falta constante de equipamento e exames - mesmo os mais básicos. O apoio à atenção básica, redes de referência e especialidades, é deficiente. A grande maioria dos pacientes, mesmo aqueles de baixa condição socio-econômica, paga pelos exames solicitados. Enfim, tenta-se oferecer uma saúde de qualidade, mas sem recursos diagnósticos e terapêuticos adequados, colocando-se o profissional em maior risco de cometer erros e o paciente de sofrer as consequências.”


“Portanto, devem-se garantir relações de trabalho e emprego estáveis, com concurso para todos os profissionais de saúde, acabando-se com os contratos e empregos temporários, além de criação de plano de cargo, carreira e salários em todos os municípios, inclusive os remotos e menores. Como dito anteriormente, o ideal seria criar uma carreira de estado para os profissionais de saúde do SUS, como existe para promotores e juízes, com entrada por concurso, a nível nacional.”


“Além disso, deve haver mais estímulos e apoio à educação permanente e à pesquisa. Aqui em Serrinha, fazemos um pouco da primeira, mas apenas uma vez ao mês, no dia de reunião geral das equipes – o que considero muito pouco, porque os assuntos a discutir são inúmeros e é grande a necessidade de aprender e se atualizar destes profissionais. Em relação à pesquisa, o apoio e incentivo é ainda menor - não tenho conhecimento de nenhum projeto sendo desenvolvido pelos profissionais de saúde do município.”

“Sou um defensor incondicional do SUS e acredito nele como um sistema capaz de transformar a realidade do nosso país, oferecendo saúde de qualidade, integral e resolutiva para todos. Infelizmente, ainda predomina a ideia que o SUS corresponde a um sistema de saúde para os pobres. É preciso mais financiamento para o Sistema Único de Saúde e este ponto perpassa pela regulamentação da Emenda 29, já citada aqui anteriormente. A regulamentação da Emenda 29 é importante não só para garantir os recursos mínimos que municípios, estados e união deverão empregar em saúde, como para definir exatamente o que é gasto em saúde e evitar os desvios e a prática de se colocar como gasto de saúde o que não se enquadra como tal, como rede de esgoto e coleta de lixo, por exemplo.”


Segundo os dados mais recentes do Ministério da Saúde, no período de 2006 o gasto público com saúde como proporção do PIB foi de 3,55 %. É muito pouco, para se chegar a uma melhor distribuição dos profissionais de saúde no país, é preciso mais investimento. Não só para se oferecer melhores salários, mas também melhores condições de trabalho, implantar o PCCS, melhorar a infraestrutura e qualidade dos serviços oferecidos. Comparando-se com os demais países da América Latina, a média de gastos em saúde é de 4,6% do PIB. Enquanto a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) recomenda que os investimentos em saúde representem 6% do PIB.

“O município de Serrinha perdeu uma grande oportunidade de oferecer à população uma atenção básica de qualidade para aqueles com cobertura de ESF. Perdeu a oportunidade de garantir médicos, dentistas e enfermeiros trabalhando os cinco dias da semana nas USFs (unidades de saúde da família). Porque o município participou do concurso realizado pela FESF (Fundação Estatal de Saúde), oferecendo 33 vagas - 11 para cada profissional de nível superior (médico, dentista e enfermeiro). Mas chamou apenas um dos aprovados no concurso, este médico que agora vos fala.”

“Sei da posição contrária do conselho municipal de saúde a respeito da FESF. Particularmente, como trabalhador da FESF, considero que esta instituição está longe do ideal, principalmente no que diz respeito à remuneração justa para os seus trabalhadores, de acordo com a carga de trabalho que é exigida. E também no que diz respeito à falta de estabilidade nos municípios e demora em implantar algumas de suas promessas, como a especialização em saúde da família e o telessaúde. Entretanto, não se podem negar os avanços que a FESF realizou na prática: desprecarização das relações de trabalho, com garantia de todos os direitos trabalhistas constantes na CLT, oferta de um Plano de Cargos, Carreira e Salários para todos os seus trabalhadores, educação permanente, estímulo à pesquisa e remuneração por produção, metas e desempenho. Mas já que o município de Serrinha optou por convocar apenas um dos candidatos aprovados pela FESF, deveria então realizar um concurso municipal para os demais trabalhadores de saúde.”



No turno da tarde, os participantes da conferência foram divididos em seis grupos de trabalho, para discutir e elaborar propostas sobre os seguintes sub-eixos:

  • Políticas Públicas, Política de Saúde na Seguridade Social: os desafios da implantação dos princípios da integralidade, universalidade e equidade;
  • Participação, Controle Social e Incremento à Ação Comunitária;
  • Os Desafios da Gestão do SUS para Reorientação de Saúde: Intersetorialidade, Financiamento, Pacto pela Saúde, Relação Público x Privado, Gestão do Sistema, do Trabalho e da Educação em Saúde;

Os delegados da equipe de saúde da família de Bela Vista participaram dos grupos de trabalho, ficando responsáveis pelo sub-eixo: Participação, Controle Social e Incremento à Ação Comunitária. Eles contribuíram com as discussões apresentando várias propostas sobre este tema, seguem abaixo algumas delas:

  • Implantação da ficha de avaliação da satisfação dos usuários: a qual já é usada na sua unidade de saúde. Foi proposto que a mesma fosse utilizada em toda rede de atendimento do SUS, especialmente nas UBS e USF. Além disso, foi proposto que houvesse uma avaliação periódica destas fichas, a cada 02 ou 03 meses por exemplo, para identificar quais os serviços que precisariam de ajustes e também para avaliar os comentários deixados. Foi proposto também que o conselho municipal de saúde (e os conselhos locais, onde houver) tenha acesso a estas fichas de avaliação;
  • Criação de conselhos locais de saúde em todas as comunidades cobertas pela ESF;
  • Impressão e distribuição da Cartilha dos Direitos dos Usuários de Saúde (vide anexo) nas unidades;
  • Divulgação da importância da participação e controle social através de cartazes, panfletos, entrevistas em rádio, etc.
  • Realização de reuniões periódicas na comunidade e convidar membros da comunidade para participar das reuniões da equipe;
  • Criação de uma Ouvidoria do SUS no município.

Posteriormente, realizou-se a plenária final, onde cada grupo apresentou suas propostas para todos os participantes da conferência e foram escolhidas as que serão encaminhadas para a conferência estadual. Depois, foram apresentadas e votadas as monções de apoio, repúdio, etc.

No final da conferência, ocorreu a votação para eleger os delegados titulares e suplentes para a 8ª Conferência Estadual de Saúde. O município de Serrinha, com uma população aproximada de 75.000 habitantes, tinha o direito de encaminhar 08 delegados titulares para a etapa estadual. Destes, duas vagas eram destinadas para trabalhadores de saúde. O médico da equipe de saúde da família de Bela Vista, Dr. Bruno Matos Corrêa, concorreu a uma destas duas vagas e foi eleito como delegado titular para participar da 8ª Conferência Estadual de Saúde.


Veja abaixo um vídeo com o pronunciamento do Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, sobre a 14ª Conferência Nacional de Saúde:


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